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quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

O meu segredo...

 


O meu Segredo...

Meu pai andava sempre contra o vento
só agora é que me lembrei, de contar.
Tinha necessidade de lutar contra os ventos da vida
... e eu, nem sequer o imaginava
o seu olhar andava sempre por longe, fixo no horizonte
com uma expressão que levei tempo a perceber
eram olhares miraculosos, cheios de brilho
que faziam que estivesse em todos lugares ao mesmo tempo.
Nunca estava perto, andava sempre por longe, sonhando e vadiando
mas a sua ausência,
não era mais do que o malogro de quem procurava ver
só agora, o sinto e o sei.

Nem sempre andava distante, nós é que o sentiamos distante
o que na prática dá no mesmo
mas quando o espreitava vía-o sempre
ali, muito perto, sentado numa imobilidade total
no pequeno cepo da oliveira, raiado de tons esverdeados
era um velho cepo, mas ainda com miolo,
com que o caruncho se deliciava
lembra-va as lagartas quando esvaziavam a fruta por dentro
tornava-se algo estranho, assim, quieto e pensativo
como resignado ao seu estranho vadiar
os olhos sempre tristes, tristeza que ainda hoje me dói
como se quizessem gritar, com uma coragem nunca abortada.

A ausência demostrada era sómente de mágoa, nunca de fracasso
a sua presença era,
altiva, mas desolada, um pouco triste
sim uma tristeza quase solene e irremediada pelo que não alcançara
só agora sei dar o valor, só agora o sei.

Por vezes mais parecia uma águia rasgando o azul do firmamento
deixando sempre um sulco de esperança por onde passava
esse sulco de cor azul, ficava deveras marcado no firmamento
por vezes o sulco esfumava-se
enquanto o seu voo continuava, para que
o irreal se tornasse real.

Meu pai era um homem com a forte nostalgia que combatia
o que nunca acontecera, e comia-lhe as vísceras
como as lagartas comem a fruta amadurecida
e então só agora é que o sei porque é que
ele calçava as suas velhas sandálias
que eram as suas companheiras nas lutas travadas

Sandálias que o faziam percorrer o firmamento de astro em astro
eram de vento as sandálias que calçara,
levando-o aonde ninguém o poderia alcançar.

Os amigos não sabiam, e eu tão pouco sonhava
via-o sempre sentado no cepo da oliveira, velho
raiado de tons esverdeados como se de uma estrela fossilizada
se tratasse.
por isso tudo era para ele mais distante e triste
sinto-o agora tarde de mais
é uma dor de remorso, que surgiu tarde de mais
que me consome víscera a víscera
como as tais lagartas que estragam a fruta dos pomares.

Mas fica sempre um segredo
de que só ambos partilhamos
e que avaramente guardamos, era indecifravel
era um segredo precioso, um segredo conspirador
que fazia parte só de nós, era um segredo
como se fosse um magia inviolavel.

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